As mulheres de Nietzsche e Freud: uma leitura laplancheana

Autores

  • Vinícius Moreira Lima (UFMG)
  • Fábio Roberto Rodrigues Belo (UFMG)

Resumo

Resumo: Nietzsche e Freud produziram representações teóricas das mulheres e do gênero feminino muito similares. Por meio do método hermenêutico-crítico e da crítica historicista, a comparação entre essas representações corrobora a hipótese de que ambos os autores contribuem para a construção de uma rede representacional que articula fortemente a mulher a elementos de passividade, masoquismo, pudor, maternidade, submissão, docilidade e rebeldia. A análise permite-nos demonstrar a tese de Jean Laplanche, segundo a qual o gênero é um esquema narrativo ou um código que traduz a sexualidade inconsciente. Para a teoria laplancheana, os arranjos de gênero fornecem uma organização possível – mas não necessária – ao sexual infantil, ajudando no processo de recalcamento. Isso se vincula a uma tradução generificada da atividade e da passividade originária em termos de masculinidade e feminilidade. Assim, acreditando que, em suas teorizações, tanto Freud quanto Nietzsche fazem uso dessa engrenagem tradutiva, herdada do social, torna-se fundamental desconstruir a imagem da mulher presente nos dois autores a fim de abrir espaço para representações menos comprometidas com a perspectiva falocêntrica.Palavras-chave: gênero; mulher; sexualidade; falo; passividade. Abstract: Nietzsche and Freud have produced very similar theoretical representations of women and the feminine. By using a critical-hermeneutic method and a historicist critique, the comparison between these representations confirms the hypothesis that both authors contribute to the construction of a representational network that strongly articulates women to the elements of passivity, masochism, shame, maternity, submission, docility, and insurgency. Our analysis lets us demonstrate Jean Laplanche thesis’ that gender is a narrative scheme or a code that translates unconscious sexuality. For Laplanchean theory, gender arrangements provide a possible – but not necessary – organization to the infantile sexuality, aiding the process of repression. This gets associated to a gendered translation of activity and original passivity in terms of masculinity and femininity. Thus, believing that, in their theories, both Freud and Nietzsche utilize this translation engine, inherited from the culture, we find it essential to deconstruct the image of woman present in both authors, in order to open the way to representations that are less compromised to a phallocentric perspective.Keywords: gender; woman; sexuality; phallus; passivity.

Referências

Belo, F. (2011). Tragédia e ironia na história da psicanálise. In F. Belo, L. R. Marzagão & A. M. Pereira (orgs.), Sobre o amor e outros ensaios de psicanálise e pragmatismo. Belo Horizonte: Ophicina de Arte & Prosa.

Deleuze, G. (1988). Foucault. São Paulo: Brasiliense.

Freud, S. (1996a). Sobre a psicopatologia da vida cotidiana. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas (V. Ribeiro, Trad., Vol. VI, pp. 19-272). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1901).

Freud, S. (1996b). Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas (V. Ribeiro, Trad., Vol. VII, pp. 117-229). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1905).

Freud, S. (1996c). Leonardo da Vinci e uma lembrança de sua infância. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas (D. Marcondes, J. B. Corrêa, W. I. de Oliveira, D. Mussa, C. da S. Costa, J. Salomão, P. D. Corrêa, Trad., Vol. XI, pp. 73-141). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1910).

Freud, S. (1996d). Os instintos e suas vicissitudes. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas (T. de O. Brito, P. H. Britto, C. M. Oiticica, Trad., Vol. XIV, pp. 123-144). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1915).

Freud, S. (1996e). “Uma criança é espancada”: uma contribuição ao estudo da origem das perversões sexuais. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas (E. A. M. de Souza, Trad., Vol. XVII, pp. 195-218). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1919).

Freud, S. (1996f). A organização genital infantil: uma interpolação na teoria da sexualidade. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas (J. O. de A. Abreu, Trad., Vol. XIX, pp. 157-161). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1923).

Freud, S. (1996g). O problema econômico do masoquismo. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas (J. O. de A. Abreu, Trad., Vol. XIX, pp. 177-188). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1924).

Freud, S. (1996h). A dissolução do complexo de Édipo. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas (J. O. de A. Abreu, Trad., Vol. XIX, pp. 193-199). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1924).

Freud, S. (1996i). Algumas consequências psíquicas da distinção anatômica entre os sexos. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas (J. O. de A. Abreu, Trad., Vol. XIX, pp. 277-286). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1925).

Freud, S. (1996j). Feminilidade. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas (J. L. Meurer, Trad., Vol. XXII, pp. 113-134). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1933).

Giacoia Jr., O. (2002). Nietzsche e o feminino. Natureza humana, 4(1), pp. 9-31. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-24302002000100001. Acesso em 21 abr. 2017.

Laplanche, J. (1988). Problemáticas II: castração/simbolizações. São Paulo: Martins Fontes.

Laplanche, J. (1997). Freud e a sexualidade: o desvio biologizante. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.

Laplanche, J. (2015a). O gênero, o sexo e o Sexual. In J. Laplanche, Sexual: a sexualidade ampliada no sentido freudiano 2000-2006 (pp. 154-189). Porto Alegre: Dublinense.

Laplanche, J. (2015b). Três acepções da palavra “inconsciente” no âmbito da teoria da sedução generalizada. In J. Laplanche, Sexual: a sexualidade ampliada no sentido freudiano 2000-2006 (pp. 190-206). Porto Alegre: Dublinense.

Laplanche, J. (2015c). Castração e Édipo como códigos e esquemas narrativos. In J. Laplanche, Sexual: a sexualidade ampliada no sentido freudiano 2000-2006 (pp. 280-287). Porto Alegre: Dublinense.

Nietzsche, F. (1968). The Will to Power. Nova York: Vintage Books.

Nietzsche, F. (1999). O caso Wagner: um problema para músicos / Nietzsche contra Wagner: dossiê de um psicólogo. São Paulo: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1888).

Nietzsche, F. (2005a). Humano, demasiado humano: um livro para espíritos livres. São Paulo: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1878).

Nietzsche, F. (2005b). Além do bem e do mal: prelúdio a uma filosofia do futuro. São Paulo: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1886).

Nietzsche, F. (2006). Crepúsculo dos ídolos: ou como se filosofa com o martelo. São Paulo: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1888).

Nietzsche, F. (2008). Ecce homo: como alguém se torna o que é. São Paulo: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1888).

Nietzsche, F. (2011). Assim falou Zaratustra: um livro para todos e para ninguém. (P. C. de Souza, Trad.). São Paulo: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1883-1886).

Nietzsche, F. (2012). A gaia ciência. São Paulo: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1882).

Downloads

Publicado

2017-07-31

Como Citar

Lima, V. M., & Belo, F. R. R. (2017). As mulheres de Nietzsche e Freud: uma leitura laplancheana. Natureza Humana - Revista Internacional De Filosofia E Psicanálise, 19(1). Recuperado de https://revistas.dwwe.com.br/index.php/NH/article/view/248

Edição

Seção

Artigos de fluxo contínuo