O lugar do pai no contexto da regressão clínica/The role of the father in the context of regression in clinical practice

Autores

  • Flavio Faria

DOI:

https://doi.org/10.59539/1679-432X-v9n1-52

Resumo

Ao substituir a teoria da sexualidade por uma teoria do amadurecimento cujas bases são a necessidade de ser e a tendência inata ao amadurecimento, Winnicott não apenas trouxe para o âmbito da psicanálise a importância do ambiente real, não simbólico, no amadurecimento do lactente, mas também, entre outras contribuições inovadoras, ampliou de modo surpreendente nossa visão do papel e das funções do pai nesse processo. Com o abandono da teorização metapsicológica, a figura paterna foi deslocada de sua função nas questões relativas ao complexo de Édipo e passou a ocupar lugar permanente em todo o processo de amadurecimento do lactente, da criança e do adolescente. Nos estágios iniciais, desde a dependência absoluta, o pai não apenas dará provimento às necessidades da unidade mãe-bebê, como poderá ser a mãe-susbstituta que sustentará no tempo a integração do lactente, quando a mulher não puder oferecer tal provisão. Ainda será ele quem, nos estágios iniciais, ao chamar para si, e, portanto, para a realidade externa, a mulher, irá lhe ajudar na separação gradual com o lactente, auxiliando-a no cumprimento de seu papel na desilusão da onipotência do bebê.   Mais tarde poderá ser o elemento de proteção da mãe contra a agressividade da criança, além de servir como o interventor que permitirá a ela criar sentidos para a angústia da impotência devida às questões relativas às relações triangulares. Será também o pai o homem real que, ao não se enquadrar nas projeções da criança e sobrevivendo aos seus ataques com firmeza e afeto, permitirá a esta discriminar entre fantasia e realidade.  A figura do pai, entretanto, só se constituirá na ótica da criança após estarem cumpridos os estágios e as etapas necessárias para garantir a integração da impulsividade instintual e o caminho para a entrada no concernimento. Por este motivo principalmente, no processo de regressão na clínica, notadamente em pacientes que apresentam sintomatologia borderline, poderemos encontrar casos em que haverá uma nítida concentração de lembranças e conflitos com foco na relação com a figura paterna. Esse fato poderá nos levar a uma interpretação equivocada das origens da problemática do paciente, podendo, de modo enganoso, orientar o olhar do analista para uma leitura de questões edípicas e, por decorrência, para um fazer clínico interpretativo que facilmente redundará em uma pseudocompreensão metapsicológica, acobertando, com riscos reais ao paciente, as origens primitivas do quadro apresentado. Neste trabalho são apresentadas algumas vinhetas clínicas com o objetivo de ilustrar as considerações feitas sobre os riscos de se focar o olhar do clínico apenas nas questões relativas às lembranças e conflitos com a figura paterna, notadamente em pacientes borderline que apresentem tendência mentalizadora.Palavras-chave: psicanálise; clínica psicanalítica; pai; Winnicott.

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Publicado

2014-06-01

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Artigos